quinta-feira, 24 de maio de 2012







Abstrações. Luís Fernando Veríssmo.

"Deus não joga dados com o Universo", disse Einstein, para nos assegurar que existe um plano por trás de, literalmente, tudo,  que o comportamento da matéria é lógico e previsível. A física quântica depois revelou que a matéria é mais maluca do que Einstein pensava e que o acaso rege o Universo mais do que gostaríamos de imaginar. Mas fiquemos com a palavra do velho. Deus não é um jogador, o Universo não está aí para Ele jogar contra a sorte e contre Ele mesmo. Já os semideuses que controlam o capital especulativo do planeta Terra jogam com economias inteiras e podem destruir países com um lance os seus dados, ou uma ordem dos seus computadores, em segundos. 
Às vezes eles têm uma cara, e até opiniões, como o Soros, mas quase sempre são operadores anônimos, todos com 28 anos, e um poder sobre as nossas vidas que o Deus de Einstein invejaria. Deus, afinal, é sempre o ponto supremo de uma cosmogonia organizada, não importa qual seja a sua religião. Todas as igrejas - a não ser a do Triângulo Místico, fundada anteontem, provavelmente em Brasília - têm metafísicas antigas e hierarquizadas. Todos os deuses podem tudo, mas dentro das expectativas e das tradições da suas respectivas fés. Até a oniptência tem limites.
A metafísica dos operadores, dos deuses de 28 anos, é inédita. Não tem passado nem convenções. É a destilação final de uma abstração, a do capital dessociado de qualquer coisa palpável, até do próprio dinheiro.  Como o dinheiro já era a representação da representação da representação de uma valor aleatório, o capital transformado em impulso eletrônico é uma abstração nos limites do nada - e é ela que rege as nossas economias e, portanto, as nossas vidas. E quem pensava ter liberado o mundo de um ideal inútil, o de sociedades regidas por abstrações como igualdade e solidariedade, se vê prisioneiro do invisível, de um sopro que ninguém controla, da maior abstração de todas.