segunda-feira, 25 de julho de 2011

Publicação de uma crônica, do Jornal Brasil de Fato, de 7 a 13 de julho de 2011. A crônica é de Elaine Tavares, jornalista. Publico aqui uma parte da crônica.

"...'Hoje, os mais novos são formados em solidão', diz Elza. Não há mais saídas em família. Os amigos se telefonam e se convidam para sair. Nunca para entrar. Não há jantares nas casas uns dos outros, ninguém se visita. Os encontros são feitos em bares, restaurantes, campos neutros, descomprometidos, impessoais. As pessoas têm amigos virtuais, se encontram pela rede, trocam e-mails e, em casa, afundam-se numa poltrona em frente à televisão. Nas ruas há medo, ninguém mais senta às calçadas, as crianças brincam nos plays. E nas gavetas dos armários proliferam os alprazolans(drogas químicas), porque, mesmo diante dessa realidade, é uma obrigação social que a pessoa seja "felizinha".
As lembranças de Elza, e minhas também, são de um tempo outro, quando o sistema capitalista ainda não tinha aprofundado suas raízes no nosso país. Agora, diante do quadro de dependência econômica e superexploração do trabalho - típicos do capitalismo dependente - quem tem tempo para sentar às calçadas, comunitariamente, a contar histórias? Há que estar o tempo todo a trabalhar, ganhar dinheiro, para comprar mais, e mais, e  mais. A roda do consumo girando loucamente, inclusive no que diz respeito às pessoas. Aquele que consegue manter um amigo por mais de cinco anos é quase um héroi. As relações são fluidas, supérfluas, descartáveis.
Elza que é otimista, não choraminga. Ela analisa seu tempo, fala com saudade do que já passou, mas afugenta a tristeza. 'Esse é um tempo novo. Haveremos de encontrar caminhos. Mas que há muita solidão, isso há'. E tem horas que dói! Mas a solidão de que fala não é simplesmente essa de se estar sozinho no meio do nada. É a triste solidão de estar vazio, de não ter mais sonhos, projetos, essas molas que nos tocam para frente, a utopia.
A certeza aparentemente absurda de se olhar um campo vazio e saber que ali nascerão flores. Assim andamos nesses tempos sombrios. Com olhos visionários, a vislumbrar o que ainda virá. E o que nos faz andar é isso mesmo: a certeza de que virá!"

terça-feira, 19 de julho de 2011

Os Bruzundangas. Lima Barreto. Editora Ática. 1985. 
A primeira edição do livro é do ano de 1922, após a morte do escritor. A maioria dos textos que compõem Os Bruzundangas foram publicados, em sua maioria, primeiramente, no semanário A.B.C., do Rio de Janeiro, em 1917. 
No Brasil, tínhamos o regime republicano oligárquico(1889). Tendo o Rio de Janeiro como a capital de nosso país naquela época, Lima Barreto vivenciava o período da Bélle Époque, onde os ideais de progresso e de modernização conviviam com as crises políticas, econômicas e sociais. 
Neste livro, Barreto satiriza uma nação fictícia, o qual ele teria vivido nela por algum tempo. Nação essa com costumes e instituições muito parecidas com as de um país chamado Brasil. Na verdade, é uma clara alusão ao nosso próprio país: um Brasil oligárquico, nepotista, com um política baseada no privilégio, no favor, em títulos de nobreza, coronelismo, ignorância, pseudo-intelectualidade, exclusão, racismo etc.
Na introdução de Valentim Facioli, dessa edição citada acima, revela-se peculiaridades sociais muito parecidas entre os dois países (Bruzundanga e Brasil): sonha o dominado em ser como o dominador, eis aí um dos grandes segredos da dominação. Os mais fortes devorando os mais fracos, às vezes até com a anuência destes. 
Enfim alguns trechos do livro, coloco aqui apenas algumas frases representativas do que seja a obra,  penso eu. Mas o melhor é ler o livro por inteiro mesmo!
Já no prefácio, Barreto cita a frase de um livro " A Arte de Furtar"(obra anônima portuguesa do século XVII),  na qual diz: "os maiores ladrões são os que têm por ofício livrar-nos de outros ladrões". A Bruzundanga fornece matéria de sobra para livrar-nos, a nós do Brasil, de piores males, pois possui maiores e mais completos.
Os samoiedas são os literatos de lá. A literatura em Bruzundanga: quanto mais incompreensível é ela, mais admirado é o escritor que escreve, por todos que não lhe entenderam o escrito.
Os vates (poetas) vestiam-se com peles de urso, de renas, de martas (gênero de mamíferos carnívoros) e raposas árticas. Lembra-nos Barreto, que Bruzundanga fica nas zonas tropicais e subtropicais. Porém, a estética da escola Samoieda pedia que eles se vestissem assim.
A conversas entre os três vates ( Kotelniji, Wolpuk e Korspikt) demonstra toda a harmonia imitativa que a poesia bruzundanguense tentava realizar num esforço "parvoítico" de se equiparar com estilos europeizantes de rimas e métricas poéticas. (Uma crítica ao simbolistas e parnasianos com ares europeizantes).
Os samoiedas contentam-se com as aparências literárias e a banal simulação de notoriedade...

Em Bruzundanga, quando (em geral) as pessoas vão estudar medicina, não é a medicina que eles pretendem exercer, não é curar, não é ser um grande médico, é ser doutor.

Um Grande Financista: Felixhimino Ben Karpatoso. Era financista e foi tido como o parlamentar mais chic do Congresso Nacional. O que importava aqui são os ademanes(modos, trejeitos, gestos) de cada um. Ainda mais que Karpatoso acabara de regressar da Europa. O novo presidente de Bruzundanga chamava-se Idle Bhras. (Idle em inglês quer dizer ocioso).

A Nobreza da Bruzundanga: a Doutoral e a de palpite. A doutoral é constituída por cidadãos formados nas escolas, chamadas superiores (medicina, Direito e Engenharia). Tem privilégios ditados pelas leis ou pelos costumes.
O título doutor, em Bruzundanga, anteposto ao nome tem o efeito do Dom em terras da Espanha.
A outra nobreza são os titulares de palpite: marquês, duques, condes, com sobrenomes e pronomes de importância, considerando-se então constituídos de nobreza por pertecerem a familia tal.

A política e os políticos da Bruzundanga: A primeira coisa que um político de lá pensa, quando se guinda às altas posições, é supor que é de carne e sangue diferente do resto da população. Não há lá homem influente que não tenha, pelo menos, trinta parentes ocupando cargos do Estado.

O ensino da Bruzundanga: Os títulos, como sabeis, dão tantos privilégios, tantas regalias, que pobres e ricos correm para ele. Mas só três espécies que suscitam esse entusiamo: o de médico, o de advogado e o de engenheiro.

A diplomacia da Bruzundanga: Pelo simples fato de terem palmilhado terras estranhas e terem visto naturalmente algumas obras-primas, os diplomatas da Bruzundanga se julgam todos eles artistas, literatos, homens finos, genltmen. O ideal de todo e qualquer natural de Bruzundanga é viver fora do país.

Os heróis: Aqui Barreto cita o Visconde de Pancome ( que seria uma alusão à Barão de Rio Branco). Um país como a Bruzundanga precisa ter os seus heróis e as suas heroínas para justificar aos olhos do seu povo a existência fácil e opulenta das facções que a têm dirigido.

A sociedade: A política não é uma grande cogitação de guiar os nossos destinos; porém, uma vulgar especulação de cargos e proprinas. A gente de Bruzundanga gosta de raciocinar por aforismos. sobre toda as coias, eles têm etiquetadas uma coleção deles. Diria perfunctoriamente ( Que se faz só por se dizer que se faz, e não por necessidade ou com algum fim útil.).

As eleições: Os eleitores têm tendência de votar em conhecidos ou amigos.

A organização do entusiasmo: "...canalizar, de disciplinar o entusiamos do povo bruzundanguense..."; "...procurando dar às manifestações um cunho de novidade..."

Religião: Católica Apostólica Romana.

Uma provincia: A brutalidade do dinheiro asfixia e embrutece as inteligências. A polícia sob este ou aquele disfarce, abafa a menor tentativa de crítica aos dominantes.

MENTALIDADE DE PARVENUS: termo francês que designa o indivíduo que ascendeu socialmente sem aprimorar seu modo de agir ou de pensar (intelecto).

VIVA A BRUZUNDANGA!!!